
Hoje estou todo negro.
Vesti-me de preto do tórax à planta dos pés.
Fiz isso, pois precisava
sentir a mim e me inebriar na exatidão
que qualquer outra cor não poderia correlacionar
ao meu estado de espírito.
Fiz isso, pois meu interior jaz em negro violento,
obscuro e silencioso.
Fiz isso por que me cansei de tantas cores
que a vida parece ter.
Meu ser agora é todo negro.
Negro da cor do nada.
Negro que nega o tudo.
Cansei de tudo.
Das palavras sempre bem elaboradas no papel,
do livro sempre lido que de tão lido
está surrado e já com páginas amareladas.
Dos sorrisos de dentes brancos.
Da mesma casa, dos mesmos gostos,
dos mesmos discos novos.
Da internet sempre atual. Do vermelho vivo
que as luzes dos carros emitem no transito.
De palavras sempre belas
e repetidas, dos desejos e insinuações.
Desta minha fé morta, que de tão morta
move montanhas.
Das mesmas pessoas, dos mesmos assuntos,
das mesmas casas, das mesmas caras.
Estou cansando e sobrecarregado.
Cansei desta velha casca desgastada
que carrego sempre
e que com ela vou vivendo até um dia me acabar.
Cansei de tudo que é cor.
Cansei de tudo que é meu e mais um pouco
que tomo emprestado dos outros.
Tudo o que me resta é esta casca.
Esta velha casca desgastada.
E esta angustia existencial inacabada
Fernando Martins
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